Mira era conselheira de uma instituição em que trabalhei, uma senhora séria, por trás de seus grossos óculos de acadêmica; já não dava aulas, mas trabalhava em pesquisas particulares e da tal instituição da qual era membro. Escritora laureada com inúmeros livros publicados recebera vários prêmios de literatura.
Entre outras citações de sapiência, ficou na memória o ensinamento: “_Ah, eu gosto muito de caminhar logo depois do almoço, a gente fica o dia sentada, e essa hora é ótima pra andar e eliminar os gases.”
Dia destes fui a uma festa, em uma cidade a cerca de 300km; junto, um amigo que fazia a estrada parecer curta, e íamos rindo, contando e inventando histórias, possíveis, impossíveis, e pelo riso incessante... Risíveis.
Tudo correu bem e a festa para crianças foi um sucesso, doces, pipocas, brincadeiras, refrigerantes, bolos, sanduiches. De lá fomos ao sítio de outro amigo, que ficava na localidade, vinho, churrasco, queijos, presunto...
Na volta aquilo tudo começou a pesar, mais que o escuro da Rodovia Raposo Tavares, mais que a chuva que caía...
Dores lancinantes dos gases pressionando órgãos internos, já nem ria mais das besteiras que eu mesmo falava, dos casos que ouvia.
Por sorte, o amigo que estava de carona morava uma cidade antes, e assim o deixei quase uma hora antes de chegar em casa, e tão logo ele saiu do carro, os gases puderam ser liberados e as dores passaram.
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Claudio trabalhava em um grande centro de documentação. Àquele dia, já final de tarde sente a pressão dos gases originados a partir da feijoada do almoço. Sabe como é, feijão preto, couve, torresmo... A comilança foi boa, tanto que seu abdômen lembrava o do porco que comera... Sentindo-se aperreado, subiu ao depósito superior, onde ficavam apenas revistas antigas e onde portanto dificilmente alguém ia até lá... Passou pelo primeiro corredor de estantes, pelo segundo, pelo terceiro, e no quarto decidiu: estava longe de qualquer ser vivente...
Aliviou-se, sem estrondos... Uma careta talvez... Mas... Sabem como é, gases costumam ter odores, e esses eram perigosamente fétidos...
Bem, já estava aliviado e resolveu descer ao setor, quando vem chegando ao final do corredor, ali, na quarta fileira de estantes de acervo histórico, que ninguém solicitava... a Margarida, moça bonita, que trabalhava em outro setor, aliás, chefe de outro setor.
Ele apenas continua seu caminho, respondendo sério e preocupado ao cumprimento da moça, que se direciona para o fundo da quarta fileira de estantes...
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Conheci Zilá quando morava em Santos, ela uma cafuza original, arroxeada, cabelos lisos, baixinha, rosto redondo, com um sorriso constante nos lábios e uma jocosidade em todo seu gestual. Morava em um amplo apartamento já nas imediações de São Vicente, quinhão que lhe coube na separação do marido, estrangeiro que já não me recordo a naturalidade, e que se apaixonara pelos traços nativos e que segundo ela já devia ter voltado à sua terra.
Segundo a própria, separaram-se por um peido...
Lembro-me de ter ficado estupefato e quis saber: _Mas como assim?? E ela não se fazendo de rogada disse que um dia, já depois de alguns anos de casada, estava ela na copa arrumando algo, que nem lembro e nem vem ao caso, enquanto o marido assistia televisão na sala.
Em determinado instante ela solta um “Pum”, que pelo andar da história saiu em alto brado retumbante... Prrrrrrrrrrrrrummmm. E o marido pergunta: _Que foi isso? Ouviu um barulho! Ela responde:_Um pum. E ele parte ao ataque em tom ríspido: Isso é uma falta de respeito, má-educação! E na minha terra o marido larga a mulher se ela faz isso! Ela não tem dúvidas: _Ah, é? Pois então leva essa pra sua mãe: Prrrrrrummmmm!!!! Leva esse pro teu pai: bruuuuuuuum! Leva esse pro teu irmão: Puuuuussssssh!!!!
E assim ele pediu a separação alegando que a esposa não respeitava o marido. O juiz deu a ela o ganho na ação pelo direito ao imóvel, já que não via ali motivo de separação. Ela prosseguiu a vida, contente e já sem gases.