quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Mãe aceita e compreende tudo!

Júnior levou um baita susto, quando logo pela manhã a mãe, de sopetão,  entra em seu quarto; era sábado e ela o acorda às 09:00hs abrindo a janela e erguendo cortinas. Ele ajeita-se na cama e olha para mãe que com ar preocupado e olhar condescendente diz: 
_ Júnior, eu sou sua mãe, sempre lhe apoiei, te amo, e compreendo. Eu quero ouvir de você meu filho: Você é?
_Que é isso mãe? Tá louca? Que história é essa?
_Júnior, eu sou sua mãe, lhe aceito do jeito que você for, já encontrei evidências, já me contaram e foi pessoa séria quem falou. Eu vou continuar te amando, te apoiando, te respeitando do mesmo jeito. Eu só quero que você me diga meu filho. É verdade?
_Mãe, tão enchendo a cabeça da senhora, isso não tem fundamento não. Agora a senhora vai ficar acreditando nesse povo? 
 
A tensão era grande, Júnior já com taquicardia e o sono tinha passado de vez!
 
_Júnior, meu filho, eu vou perguntar pela terceira e última vez. Se eu tiver que saber, prefiro que seja dito por você, e a hora é agora. Se você não me contar agora, e eu souber depois vou ficar muito desapontada. Você é meu filho e ninguém te ama mais do que eu. Eu vou te dar todo apoio e te entender. Você sabe que o que eu puder fazer por você eu faço, então é última vez que eu pergunto: Meu filho, você é?
 
Pausa que parecia ser eterna, Júnior cabisbaixo, ergue os olhos, encara a mãe e dispara:
 
_Tá bom mãe, já que um dia a senhora ia saber mesmo, então tá: eu sou, eu sou gay sim!
 
Se Júnior tinha se assustado ao acordar, quase cai da cama com o alto brado retumbante da mãe:
_O quêê???? Que história é essa? Que eu tava sabendo é que você era maconheiro, mas filho gay, eu não aceito nãããão!!!

quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

Francinette, a hipocondríaca insone


Ainda nestas mesmas da postagem anterior férias, visitamos (Francinette, Mário, que nos hospedava e eu) Clara, uma conhecida em comum que esteve a morar em Fortaleza. Clara era fã de butiques e usava sempre as melhores grifes, por isso mesmo, era comum a chamassem de Clara Dancing Days, ou devido a beleza facial desfavorecida, de Clara Crocodilo, já que apesar do corpo jeitoso, como diziam alguns, o diabo tinha peidado em sua cara. Ginecologista, tinha amizade com Francinette desde tempos imemoriais, estudaram juntas no colegial e passaram na mesma faculdade em Fortaleza, onde os pais, de recursos avantajados, as bancaram. Isto serviu para aproximá-las mais, divisão de apartamento, e até um ou outro namorado. Clara nos serviu iorgutes e biscoitinhos, foi uma tarde agradável, depois pizza lá pros lados da Volta da Jurema, e nos recolhemos na casa de Márcia que nos hospedava.


 
Fomos todos dormir. Anette antes de recolher sente cólicas e constata diarréia. Daquelas fortíssimas, constantes e mal-cheirosas. Começa aí seu dilema, era inicio dos anos 1990 e a doença da vez era cólera. E Anette, sem querer acordar ninguém, fica a remoer-se, é cólera, eu vou desidratar, vou morrer aqui longe de casa, e agora? E toma água para reidratar-se, e se lastima pela morte próxima, tão jovem, nem tinha feito nada na vida ainda, e morrer de cólera, logo ela que era médica, quando de repente lembra: Ah, mas não tá como água de arroz não... Então não deve ser cólera, mas é o quê? AIDS? Ah, meu Deus, como foi que eu peguei isso? Eu sempre me cuido, não é possível, e agora?, e a vergonha quando minha família souber?, quanto tempo eu ainda vou ter de vida? Mas... Se fosse AIDS meu cabelo já tinha começado a cair... É cólera mesmo... E esse dia que não amanhece, e eu aqui desidratando... E ninguém acorda... E faz soro caseiro, e impacienta-se cada vez mais, pois já não consegue beber mais água do que já bebeu, e... Peraí, mas se fosse cólera eu estaria vomitando também... É AIDS mesmo...

E assim foi grande parte da noite...
 
Quatro horas da manhã, depois de suores sem fim, mas com a diarréia já um tanto controlada, "não tinha mais nada pra sair mesmo", Anette lembra: “Foi o iogurte envenenado que aquela bruxa me deu!.  Amanhã eu a mato!!!"
 
E vai dormir. Só na manhã seguinte é que soubemos do drama da noite insone, entre gargalhadas nossas e xingamentos de Francinette.

Foto: Djair - Mesa posta para café da tarde (sem iorgute!). 

quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

Francinette, a hipocondríaca voluptuosa

Francinette, ou como todos a chamavam: Anette, era ginecologista, baixinha, loura (naquele tom que no Nordeste chamamos de "fogoió", termo que minha mãe definia como: "cabelo da cor de mel com terra"), magérrima, fogosa, metida a sensual... Em seu jaleco branco trançava os corredores do hospital alegremente alargando-o com o cadenciado balanceio dos quadris avantajados para o corpo franzino.
 

 Tida como excelente médica, era hipocondríaca... Certa feita, estávamos na praia do Futuro (Fortaleza – CE) quando ela sentiu uma pontada no peito, da barraca (subindo ao céu) vimos quando levou a mão ao peito. E parou!
 
Todos ficamos apreensivos quando ela chega esbaforida e vasculhando a bolsa nos entrega a chave do carro. “_corre pro hospital que eu estou tendo um infarto!”
 
Saímos meio desconfiados já por conhecermos a tendência a exageros da colega. Antes do final da rua, metemos o carro, a coisa que nossa heroína mais amava, em um enorme buraco, e todos apreensivos pela bronca olhamos para ela ao mesmo tempo, que apenas disse: “_Mete o pé, não se importa não!” A coisa então era grave!!
 
Chegando ao hospital, ela prontamente atendida após identificar-se como médica que era de fato, empoleirou-se em uma maca e sumiu corredor adentro levada por um enfermeiro bonitão no qual ela não deixou de reparar...
 
Quase uma hora depois, feitos os exames e radiografias, volta Anette meio que desconfiada e cabisbaixa... “_Eram gases!” A risada geral só não foi mais alta e duradora pelo “Psiu!” que recebemos da enfermeira com cara de poucos amigos.
 
Juntamo-nos para sair, mas antes de passar pela porta da frente, ainda ouvimos de Anette: “_Ah, mas vocês viram o enfermeiro??” – Novos risos.


Foto: Rodrigo de Luca - Escultura não identificada - Museu de Belas Artes - Rio de Janeiro 

quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

Àgua por cima, formiga por baixo...





A chuva cai lá fora; não é motivo de esmorecimento, ainda que fosse tormenta; a  lenha a crepitar no fogão traz calor e viço. Dásia frita peixes que Herculano e eu pescamos no dia anterior. Busco um limão no pé dos fundos, correndo debaixo da chuva que tira sarro de mim.
 
Comemos alegres, rindo e lendo as recomendações coladas na janela, entre causos de pessoas simples que chamam filtro de firto e de Rita, que quebra todos os cabos de ferramentas - pás, enxadas e tudo que tenha cabo. As risadas espantam a chuva e quando as gotas ficam menores, saímos para pegar as mangas recém-caídas de altos galhos; as palmas estão tão belas que não resistimos e as mutilamos no intuito de trazer a beleza para dentro de casa; as uvas da parreira estão verdes e nos frustram. Formigas sobem pelo corpo, tira-se a roupa para acabar com a correição*. Dio, vendo a irmã de calçola a matar as formigas pelo corpo, grita: “_É a visão do inferno!” Rimos às pampas, e ainda mais quando retruco: “_Tem uma na sua bunda!”
 
Deixamos as uvas pra lá, estão verdes mesmo, já diria a raposa. Ao contrário das lichias, saborosas em sua sensualidade rósea. A água das folhas nos banha, mas a ganância pela fruta é grande ao descobrir o sabor da fruta no pé e comer ali mesmo. Os pêssegos de igual modo; o problema em colher pêssegos é que se colhe um e comem-se dois. Até o Zi, que não gosta nem de àgua nem de lama nos acompanha e  se atira a frutaiada com gosto... 
 
Com a chuva, a cacimba está cheia, a água meio barrenta e não bebemos por isso. Limpamos folhas da bica que forma-se ao final do canal que transborda encharcando o caminho. Acima da nascente, o cruzeiro nos espera paciente para mais uma prece, mais um agradecimento, mais um pedido...
 
Retornamos contentes, o fogo ainda está aceso e um café fresquinho é produzido enquanto trocamos as roupas molhadas, tiramos os carrapichos e o picão das que trajávamos. Tio Onofre, o vaqueiro de dentes perfeitos em seus quase noventa anos,  chega contando causos de benzeção e livramentos; o céu diante de tanta alegria recolhe suas nuvens e já não há vestígios de mau humor. Ê vidão!!!


*Correiçãodesignação comum a inúmeras espécies de formigas carnívoras. 

 Foto: Dionísio Pedro da Silveira - Casa da roça - Sítio de Dionísio