quinta-feira, 23 de setembro de 2010

A CERTEZA INCERTA


Deus nosso!, que são os discursos que somos obrigados a ouvir? Preconceitos de classe média repetidos como verdade absoluta por pessoas que não têm condição social, financeira ou intelectual (já que se tornam repetidores de um discurso inconsistente), de se fazer irmanar com aqueles. Não que eles estivessem corretos, óbvio. Mas o desvirtuamento do discurso o torna ainda pior e mais arraigado.


Há ainda, os que têm opinião para tudo! Embora em grande parte das vezes sejam meras repetições de discursos de Veja – o novo testamento da classe média, ou da leitura fácil dos cadernos de cultura.


E não percebem que todos notam que este discurso é a repetição de idéias de outrem, sem transparência, sem profundidade, já que a idéia original, que não era dela, foi diluída com a inconsistência de sua retórica. E embora, como me disse uma vez a poeta Katya Carnib, uma grande amiga, o discurso seja fácil, enquanto não se exija a prática, sequer este discurso toma tom de veracidade.


E assim prosseguem a repetir impressões e traços de comportamento alienígenas, que não casam com suas posições, realidades e esperanças. E o pior, têm uma opinião pra tudo. Oswaldo Montenegro, em rico trecho discursivo que abre “A dama do Sucesso”,  propõe um brinde a todos que tiveram dúvida sempre.  E continua provocante: “Nunca vi um imbecil hesitar.” Viva a dúvida!

Foto: Djair - Namoradeira na janela.

quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Segure-se...

Esta semana no blog Diário de Myrna*, o tópico fala de segurança. E o tema me trouxe várias elucubrações... Resgatou pensamentos que eu já tinha remoído diversas vezes, talvez sem nunca digerir por completo.

Segundo o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, as três primeiras definições desta palavra são: s.f. (1391) 1  ação ou efeito de tornar(-se) seguro; estabilidade, firmeza 2  estado, qualidade ou condição de quem ou do que está livre de perigos, incertezas, assegurado de danos e riscos eventuais; situação em que nada há a temer 3  condição ou caráter do que é firme, seguro, sólido, ou daquele com quem se pode contar ou em quem se pode confiar.

Segurança? Quem a tem? Quem realmente sente-se seguro?
Recordo que quando criança, quando discordava de meus pais, sempre bradava, ora em voz alta, ora em voz íntima: “_Quando eu fizer 15 anos vou fugir de casa.” Bem, chegaram os quinze anos... E que aconteceu? Nada!

A segurança que eu imaginava obter como um passe de mágica, por ter completado a idade que tinha eleito para tal, não surgiu. Bem, vamos aos dezoito, logo substitui a idade cabalística... Nada de novo... 20...? Tampouco...

Hoje não espero mais, a segurança, o virar adulto, sei bem nunca virá com a idade, é preciso lapidar-se, sofrer, quebrar a cara, uma, duas, duzentas vezes... Óbvio que a independência econômica, o “ter algo de seu”, representado na maioria das vezes com um imóvel e um emprego estável, irão deixar-nos em um estado mais confortável. Mas segurança? Como? Porque? E os nossos medos, fundamentais? Os nossos receios primordiais? Aqueles que começam com o medo do escuro e passam pelo medo da solidão, de morrer, de não conseguir um emprego, de encontrar com a ex, de perder amizades, de frustrar pais e amigos, de ser maltratado, de morrer... E acaba com o medo do escuro, quando fecharmos os olhos pela derradeira vez.

Tem pessoas que realmente tem, ou ao menos,demonstram ter segurança. Em seus atos, na forma como decidem as coisas, com calma e serenidade. Elas existem, não digitando essas palavras, mas existem. Creio que foram as que receberam treinamento desde crianças, aprenderam a comandar, a dissimular sentimentos, a agir firmemente seja qual for a situação. E estas são pouquíssimas.

 Conheço uma delas, a qual eu dizia sempre, parafraseando a citação bíblica, que o lema era:”Caiam mil a minha direita, e dez mil a  minha esquerda, não moverei um músculo do rosto”. Um dia a idade chegou também para ela, com isso a debilidade da saúde, e como não bastasse o emprego sem esforço começou a perigar... O sorriso não se abalou, mas o corpo mirrou, somatizou e num passe de mágica (talvez a mesma mágica que eu esperava aos 15), envelheceu.

Onde estaria então toda a segurança que demonstrou sempre? Ela existia ou era uma máscara externa que ficou folgada e caiu?

Bem, o tema suscita hordas de reflexões que talvez em uma discussão à mesa de bar trouxesse risos frouxos e revoltas que enrugam testas, mas o que acredito é que nunca nos sentiremos realmente seguros, faz parte da nossa “humanidade”, e a pior forma de tentar adquiri-la é buscando-a nos outros. Uma vez ouvi de Marfisía, grande amiga: “Podem te tirar tudo, menos a experiência”. Acho que é por aí. Experimentando, ora a acertar e em outras a errar feio, mas adquirindo conhecimento, experiência a respeito de cada circunstância é que poderemos sentir um pouquinho de conforto.

*http://myrnagioconda.blogspot.com

quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Indumentárias e Carapuças

       Estranhamente, observo que as pessoas que mais criticam aparência, física ou vestuário, e comportamento de outras pessoas, são as que menos toleram quando são elas as criticadas. Estão sempre a dizer: “Nossa, porque você não pinta o cabelo?”, “Porque você não corta o cabelo?” e ai se em uma hora de completa necessidade de mudança, você resolve fazer algo do gênero, aí estarão a comentar: “Nossa!... Eu preferia sem pintar.”, “Pôxa, porque cortou? Estava tão bonito.” E por aí vai... Nunca estarão satisfeitos, seja com seu cabelo, sua pele, se você engordou, se emagreceu, se está com a roupa toda combinando ou com estilo e cores completamente destoantes.


Mas ai de ti, se resolver dar um palpite em sua indumentária ou estilo. Joga-os lentamente no lodaçal da depressão e ao afundar apoiam o pé na fossa abissal da ira, que irão destilar a terceiros. “Porque ele (a) disse isso e aquilo, mas não se enxerga mesmo... E isso, e aquilo, e aquilo outro...” 

Tem gente que se enfurece na hora e parte pra briga, se não física, pela batalha verbal que geralmente fazem sós, uma vez que a outra parte em geral, cede. 

     Mas logo vem novo comentário em cima de uma vítima mais recente:”você viu a roupa da fulana?” 

                E me remetem a música de Rita Lee que diz: “Elas pecam pelo excesso e morrem pela falta.” Excesso de comentários maliciosos e falta de pudor em declará-los publica e acintosamente, sabendo que não causaram outro efeito que a infelicidade do comentado. Ou talvez o objetivo seja realmente esse. 

                E no mundo atual que julga a tudo e todos pela aparência, o comum é realmente se comentar: viu a blusa? O corpete, a calça? A cueca? Não que eu ache uma cueca aparecendo ou uma barriga (enorme) a pular fora da blusa algo bonito. Aliás, conheço pessoas que se recusavam a sentar em determinado local à hora do almoço porque quem passasse por aquele lado (atrás das pessoas em questão) iriam ver seus “cofrinhos”... Oras, mas a intenção de um calça apertada de cintura extremamente baixa não é essa? Mostrar...? 

                E isso me recorda Danusa Leão na primeira edição do seu “Na sala com Danusa”, que dizia algo mais ou menos assim: “ Se você ver alguém de zíper aberto, avise. Mesmo correndo o risco de estragar a performance da pessoa em questão.”


Foto:  Djair - monumento ao "Cabeça de Cuia"- Encontro das Aguas -  (rios Poty e Parnaíba) Teresina -Piauí.

quinta-feira, 2 de setembro de 2010

Intimidade

Do que é feita a intimidade?

Acredito que seja de vivência, de parcerias, de compartilhamento. Seja de ideologias, gostos, experiências. Afinidades que são descobertas aqui e ali, aumentando admiração, respeito e provocando a inevitável vontade de se estar junto, de compartilhar mundos, idéias, cores...

Foto: Djair - Anjos barrocos - Igreja de S. Francisco - S. João del Rey - MG

 A experiência adquirida nestes percursos me mostra, cada vez mais, que amizades construídas de forma muito rápida e ruidosa se dissolvem com a mesma facilidade. E é incrível a necessidade de algumas pessoas de se mostrarem íntimas sem de fato o serem, e a efemeridade destas relações, pelo menos comigo que “tenho a paciência curta”.
E os “causos” são muitos e diversos. Uma vez estava eu a planejar uma festa, que daria em minha casa, já tinha formado na cabeça a lista de convidados, a decoração, o que servir, etc... Uma pessoa de minhas relações à época, ao ouvir-me comentar que daria a tal festa, saiu-se com o seguinte comentário: “_nossa, já estou me vendo lá, te ajudando a receber as pessoas...”
Resultado: não dei a festa.

De outra feita me prepararam uma surpresa, muito bonita por sinal, com um conjunto de trovadores a cantar músicas selecionadas dentre meu gosto musical, com indumentária diferenciada, instrumentos e tocadores afinadíssimos. Dias depois, uma das pessoas que participou da cota do presente, saiu-se com: “_Foi o presente mais caro que já dei pra alguém!”

Devo comentar? Bem, só vou dizer que devia ser uma forma, não muito nobre, de demonstrar uma amizade e afeto que, na realidade, não me eram assim tão dedicados.

Em outro momento, uma pessoa que me jurava amizade, que me adorava, e que tinha todas as afinidades, deste e de outros mundos, comigo rompeu a amizade certa vez porque eu não quis convidar uma terceira pessoa, amiga daquela, para passar o natal na minha casa. E olhe que eu não disse que não poderia trazer o tal fulano, mas apenas que eu não iria convidar uma vez que a pessoa em questão se aproveitava de uma terceira pessoa amiga e que era influenciável e carente a ponto de emprestar cartão de crédito para pagamento de compras que nunca eram ressarcidas. Teria eu obrigação de recebê-la em minha casa? Acredito que além de não ter, a vibração dela não estaria de acordo com as dos demais. 

Claro, houve casos em que achei que uma pessoa seria meu amigo por muito tempo, talvez para sempre, e depois disso, passada uma primeira impressão, que às vezes dura meses, vendo de perto as falhas de caráter, os jogos com pessoas e fatos a fim de tirar proveito pessoal, distanciei, e passei cada vez mais a evitar. Estranhamente, as pessoas às vezes ou não notam ou ignoram esses sinais de distanciamento. E em casos assim dá vontade de falar: “mantenha a distância,” e de exigir o comprimento de um braço, como na organização de filas nas escolas públicas brasileiras à época da ditadura. Deve ser como se portam no exército...

Teve uma vez, inclusive, ao trabalhar em uma empresa para a qual já tinha prestado serviço há alguns anos e onde conhecia uma pessoa, mais de ver que de falar, e mesmo de avistá-la pode-se contar nos dedos de uma única mão as vezes que isto aconteceu, ao chegar para os primeiros dias de trabalho, soube que a tal pessoa era minha melhor amiga de infância, acreditavam que tínhamos comido no mesmo prato, tal grau de intimidade aquela demonstrava para comigo, e todos na empresa, através dela já me conheciam, sabiam quem eu era, meus gostos, relacionamentos, competências e acredito que até a cor da cueca que eu usava na ocasião.

Você faz o quê? Eu afasto-me rapidamente. Detesto pressões, detesto prisões. E quanto mais se insiste na participação em amigos-secretos, e festa de finais de ano, menos vontade tenho de ir. Rabugice? Pois muito bem, que seja! Já dizia minha mãe, eu ainda adolescente, que quando eu ficasse velho ninguém iria me suportar e eu morreria só. Que venha a morte! E por favor, só apareça no velório se for íntimo de verdade.