Primeiro são uns poucos fios brancos nos cabelos, um aqui, outro
acolá, leva-se na graça, acha-se bonito, até porque no dizer de
uma amiga, não são nada demais, “fod* é mesmo o primeiro
pentelho branco, esse sim te dá direito a três dias de depressão
sem sair de casa...” Aguardemos... Mas ai, vem alguém, uma tia
inconveniente por exemplo, e de graça arranca o fio. Logo alguém
emenda: “_Ahhh mas se alguém arranca um nascem três.” Seja
pela crendice, seja pela idade que chega imperceptível, eles
aumentam, gradativamente. No inicio ficam bonitos, caem bem, dão um
charme, e na foto do passaporte dão aquele ar respeitável, como se
cabelo (branco ou em forma de bigode) fosse sinônimo de respeito. Às
vezes tentamos escondê-los, e vamos às tinturas, sem receio de
repetirmos o papel de Dirk Bogarde em Morte em Veneza. Outros muitos
optam pelo boné, e aos quase sessenta os usem virados para trás
como se fossem um jovem skatista. E quem nem sabe o que é ciático,
que dirá dor... A morte é a mesma, só não tem o Mediterrâneo de
fundo. Pelo menos livra-se da cena trágica de, ao morrer, o último
suor escorrer pelo rosto com a cor da tinta que tentava ocultar a
idade.
Mas, a vida continua, vamos a ela... Uma bela tarde está concentrado
no trabalho e começa a perceber o quanto tem errado, palavras,
números, e resolve marcar um oftalmologista... Suuuuurpresa! Não
0,25, não meio grau, mas uma bela e grande pontuação... Sim, a
vista cansou, talvez o brilho dos olhos já tivesse ido na frente e
não percebemos, afinal eles estão mesmo embaçados... E ai um dia
ao levantar... Dor nas costas? No joelho? Na coxa? Friagem? Mau
jeito? Não, é ela com seus passos de alma que mostra que chegou.
Como diz a mesma amiga já citada: “depois dos quarenta, no dia que
você acorda sem dor, pensa logo: Morri!” Mas vamos indo, pelo
menos a dor circula, cada dia é num lugar, para não ficar monótono,
claro!
E à medida em que os anos passam, as saudades de tempos passados vão
ficando mais frequentes, é a grapette que não existe mais, o bolo
de laranja que a tia fazia, o sorvete em tal lugar, e mesmo espécies
de fruta que desapareceram. Essa nostalgia também é na verdade...
saudades do que éramos àquele tempo, mais agéis, mais alegres,
mais despreocupados.
É comum em uma festa mais... “elaborada” cruzar com senhoras
muito, muito entradas em anos e vê-las sem uma ruga, nenhuma ruga.
Nem de expressão. E ainda dão-se graças aos céus quando a tóxina
butolinica é o balsámo da fonte da juventude, pois o efeito bisturi
costuma ser pior. Aquela impressão de que se ela sorrir, faz
xixi...
Conheço gente que evita envelhecer evitando o assunto. Falou-se em
idade, envelhecimento, ou qualquer pormenor que os lembre, fecham a
cara, fecham-se em copas. Será senilidade ou medo?
Homens e mulheres tentam aprisionar a juventude mantendo relações,
ao mais vezes extra-conjugais com parceiros mais jovens. Como
vampiros tentam sugar-lhes a juventude, como se pudessem absorver a
pele tenra, o viço no olhar. Não a tôa vampiros exercem há tempos
fascínio, na literatura, no cinema, salvo raras excessões são
representados como belos, jovens, sensuais.
Bem enquanto escrevia envelheci, células morreram, fios
embranqueceram. É inevital e a melhor maneira de envelhecer é...
Não querer fugir da própria idade.