Antigamente
dizia-se a ponto de virar ditado: “chegou atrasado e quer sentar na janela.”
Bem, o dito popular hoje já não faz sentido... Foi desatualizado pela pressa.
Ao menos na
cidade de São Paulo, nos ônibus, a maior parte dos passageiros procura sentar-se
do lado do corredor, embora, pela paisagem encardida que não vale a pena ser
apreciada, por entre carros e prédios cinzas, sujos e escuros, ainda se possa
ver alguns ipês floridos a semear esperança com seus cachos rosa ou com o
esplendor de seu amarelo luminoso, a colorir os olhares dos que se voltam a
eles, e também manacás e quaresmeiras a
insistirem em colorir algumas ruas, apesar da prefeitura e seus podadores
assassinos não cooperarem.

Não, não vou
falar sobre os que ocupam os lugares reservados a idosos, grávidas e
deficientes, e fingem não vê-los, pois desses já falei em outro texto... Nem da
péssima educação e desprezo demonstrado para com o outro dos que se sentam ao
lado de quem esteja à janela e viram suas pernas para o corredor dando as
costas para o passageiro que ali já estava... Também não vou falar dos DJs de
busão e metrô que mesmo com fones de ouvido incomodam com seus sons, e muito
menos do antigo e esquecido atestado de boas maneiras explicitado no “com
licença?” que ainda vinha acompanhado de um sorriso... Voltemos ao ônibus que
ainda não chegamos ao ponto final...
Berra-se aos
celulares, diaristas contam detalhes das manias esquisitas de patroas, narram
bravatas do que teriam dito, contam vantagem do patrão melhor que o da outra...
Motoristas arrancam como se esporassem um burro xucro, param o coletivo longe
das calçadas e de acessos a estes, não dão a mínima aos corpos idosos a
arrastarem pernas cansadas que já não obedecem tão bem aos comandos... Isso sem
falar nos que passam direto em pontos, só para não pegá-los. Alguns ainda
reclamam e alegam que eles não pagam passagem... acaso isto teria influência em
seu salário (parco) findo o mês?
Trocadores
assediados por moçoilas interessadas no tipo ficam eloquentes, risonhos e
atenciosos - pavões a exporem suas caudas na lotação.
Piriguetes de
Busão debruçam-se sobre o motor para aproximar-se do motorista com quem trocam
palavras (não ideias) em altos brados
retumbantes, e dane-se se a enorme bunda que só não é maior que a bolsa fica no
caminho a atrapalhar o passageiro que sobe...
No resto do
ônibus, passageiros sentados ao lado dos corredores... Não, as janelas não
interessam a ninguém. Se “os olhos são as janelas da alma”, como metaforizou
alguém, vai ver que é por isso que também hoje pouco se olha nos olhos; a
pressa, a falta de educação, o descaso pelo outro, o desinteresse generalizado
não o permite.
Ainda prefiro
as janelas, ainda olho nos olhos... Estou defasado!
Foto: Edilson Marques Portugal (Javas)
Gina Guimaraes: Adorei o texto! Eu faço uso direto desse meio de transporte e é exatamente o que voce descreveu rsrs . Também prefiro a janela porque felizmente o meu trajeto é contornado por um rio e mtas árvores!
ResponderExcluirÓtimo texto! Devemos chamar a atenção para as grosserias, numa campanha para que as gentilezas prevaleçam!
ResponderExcluirLuiz Otávio pereira
Sim, muitas pessoas não olham para fora - não contemplam a paisagem, nem respeitam as outras pessoas... -. A falta de gentileza é grande mas uma certa civilidade não depende de sorrisos: dar passagem, deixar as pessoas sentarem na janela, não sentar no assento do corredor quando o outro passageiro tem dificuldade de se locomover para a janela, respeitar assentos reservados, não gritar ao celular, não contar segredos para que todo o ônibus saiba (como já ouvi segredos "públicos"...)... tudo isso é básico. Já vivi em outras cidades em que os ônibus são cheios e foi possível encontrar respeito. Ótimo texto.
ResponderExcluirIsso independe de classe social, raça e credo.... vem de cada um!!! Gentileza gera gentileza, frase "tão batida" mais que ainda ressoa!
ResponderExcluirRosane Barros: Eu ainda procuro as janelas!
ResponderExcluirSempre que tenho a oportunidade de ir de ônibus a algum local,prefiro o lado da janela.Por muitas vezes me pegava perdia em meus olhares para o nada,mas que me diziam tudo..
ResponderExcluirEu,quando andava mais assiduamente de ônibus,ficava também olhando os rostos das pessoas,pensando em cada história que aquele olhar trazia consigo...ônibus também te faz filosofar..
Texto perfeito!