quarta-feira, 14 de novembro de 2012

Saberes simples

            “Algumas pessoas não tem nada a dizer, mas você precisa ouvir muito tempo para descobrir.”

Desconheço, a autoria da frase, mas concordo plenamente; a cada vez que vou a palestras, seminários, congressos e afins, me recordo dela.

A síndrome do palco, assim como a síndrome do microfone, estão cada vez mais disseminadas, uma verdadeira epidemia, e seus atores, estes, são cada vez mais canastrões. O que torna um verdadeiro prazer quando vemos e/ou ouvimos alguém a falar com conhecimento de fato, que respeita o tempo do outro e não se perde em citações exageradas a fim de mostrar conhecimento. Aliás, aqui já falei sobre os repetidores de citações e suas referências sem fim, que se prestam a demonstrar erudição; então gostaria de pular este capítulo e deixar estes a arrebanharem fãs entre os incautos (incultos?) e fazerem seguidores às dúzias em suas redes sociais a cada nome de vulto repetido após uma frase atribuída a eles. Mas com uma densidade rasa em deus discursos.

Por isso mesmo, o texto foi aberto com uma frase anônima, pois quantos “anônimos” não têm uma sabedoria pura, clara e uma capacidade de lógica e raciocínio desenvolvidos por si próprios, pela arte da observação, o que permite que lampejos luminosos lhe invadam o pensamento? Eles o fazem sem termos científicos, não se preocupam se a oração é coordenada sindética ou assindética, não colocam palavras ou termos como “paradigma”, “baseado em evidências”, e etc. Aliás, o grande ganho de já estarmos na segunda década do século é que agora caducou o “às portas do terceiro milênio” dos discursos travestidos de novidades.

Esses anônimos iluminados nunca usaram esses termos, mas trazem em seus discursos simples e objetivos, em suas metáforas diretas e bem acertadas, um conteúdo maior que o usual “#fato” com que hoje, muita gente acha que está a comentar, a dar uma opinião, a tecer um pensamento, e na verdade não diz nada, não quer dizer porra nenhuma. Mas aqueles primeiros, esses sim tecem comentários certeiros a respeito da vida, da alma humana, da sociedade, e assim homens singelos tornam-se filósofos, como tio Onofre, vaqueiro de tia Maída, a falar sobre fazendeiros para quem serviu e cujos filhos perderam toda a riqueza acumulada pelos pais, por orgulho e gastança para ostentar, trazendo hoje a infelicidade na alma ao constatar que os amigos o abandonaram junto com a fortuna que se ia.

Ele não cita filósofos, não cita escritores laureados, cita a vida.


Foto: Djair -  Tio Onofre, vaqueiro, agricultor, rezador e sábio.

10 comentários:

  1. Talvez por dois exemplos de minha vida o Velho Joaquim, e o tio Zeca, nunca gostei dessas coisas, apesar de ter lido alguns livros ao longo dos meus 28 anos e ter algumas citações pra poder usar sempre detestei.

    Procuro sempre dar a minha visão, o meu entender, aquilo que eu quero expressar, pra mim e promeu gosto certas coisas devem ser subjetivas e não fundamentada em algum cara, que nem se quer sabemos se ele se fundamentou em alguem para lançar seus ensinamentos.

    Falo com ou sem conhecimento de causa pois sei que estando errado posso aprender e sei que se estiver certo aquilo que penso pode ir além...

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  2. "(...) e assim homens singelos tornam-se filósofos, como tio Onofre, vaqueiro de tia Maída, (...).
    Ele não cita filósofos, não cita escritores laureados, cita a vida."

    Fantástico.

    E vem MUITO a calhar com a nova onda de [re]compartilhamento de frases prontas.
    Como bem disse Simone hoje: agora a bola da vez é Pedro Bial.

    #oremos.

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  3. Ah... e um dos meus filósofos preferidos, que li a primeira vez aos 11 anos (não, eu não era precoce, era louca mesmo), Nietzsche, é um dos preferidos dos pseudo intelectuais.
    Garrei nojo de ler frases de Nietzsche por esse mundo facebookano.
    Eu sou do tempo em que pseudo intelectual fazia citação de orelha de livro, hoje os pseudos pseudos não sabem o que é orelha de livro.
    Sou do tempo em que citávamos um autor por termos afinidade, por conhecer sua obra. Hoje o povo "compartilha" imagenzinhas bonitinhas com frases atribuídas a supostos autores, muitos, nossos contemporâneos como Bial e Jabor negam veementemente tal autoria.

    E como bem lembrou o Djair no seu texto, fico ainda mais puta quando a únicas palavras que os citadores sabem escrever são: #fato e #ficadica.

    Fala sério!! #fato e #ficadica de cu é rola!!

    Simone B. Chaves

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  4. "...“#fato” com que hoje, muita gente acha que está a comentar, a dar uma opinião, a tecer um pensamento, e na verdade não diz nada, não quer dizer porra nenhuma..."

    E tenho dito...rsrsrsrsrs...


    ALex.'.Araújo

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  5. Lindo texto, querido...Fazia tempo que não passava por aqui. Estava com saudades dessa leitura leve e que toca fundo no coração. Compartilho seu cansaço com esses que falam sem parar, colocam referências sobre referências quando é fácil perceber que nunca leram o 'citado' original....cansada de quem sabe tudo de tudo, das verdades absolutas que não comportam nenhum 'mas', 'porém', nenhuma exceção à regra (mesmo que todos saibamos que sem as exceções de pouco valeriam as regras). Cansada de fatos históricos 'naturalizados', das verdades irrefutáveis, das 'etnografias', ai essas me cansam verdadeiramente porque dizem explorar a fundo a realidade, revelar cada aspecto em todo seu significado. Cansada, enfim, de tanta análise e tão pouco sentir, querido. Quero ter esse direito: apenas sentir. Beijo carinhoso. Wânia

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  6. Me fez lembrar de minha mãe. Quando teminei meu TCC, dediquei a ela verdadeira Doutora. Analfabeta, porém doutora na sociedade. Sabia de tudo e com simplicidade envolvia a todos. Grande legado que deixou.Como os citados no texto, do Djair e do mundo afora que deveríamos conhecer. Enquanto fosse tempo. Belo texto.
    Carminha

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  7. O verdadeiro saber vem da simplicidade,essa sim,detém todo o poder da criação.
    Aquela frase:"A vida ensina",é a mais pura verdade e,além de ensinar,devemos retirar dela toda aprendizagem possível,esta sim,permeará por toda nossa existência,constituindo assim,o verdadeiro saber,constituindo o indivíduo tácito,que construamos nossa subjetividade(a verdadeira,o que é muito difícl,mas não impossível).

    Beijão,Dja!!Dani.

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  8. Conheci o blog hoje através de um amigo. O Ser Humano moderno está virando uma coisa estranha. Ele cita livros que não leu, se acha jornalista ao compartilhar uma matéria de site, tá assustando já. Os Saberes Simples constroem uma verdadeira escola. Não concluí a faculdade de jornalismo, também não me sinto inferiorizado por isso. Eu só gostaria de entender uma coisa: Porque todo professor de faculdade é arrogante?

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  9. Ei Djair estou aqui rindo do seu artigo, não que ele tenha motivos mas sim que ele é uma verdade tão verdadeira que há os "sabe tudo " "que nada sabe".Muitos hoje em dia buscam renomes , mas são vazios até da própria vida quem dirá de palavras .A beleza esta na simplicidade , não nas concordâncias e citações que vemos por ai..Sou uma amante das letras mas confesso bagunço o que quero bagunçar, falo o que quero falo e tudo sai do jeito que eu pensei , com alguns devaneios mas exatamente como deveria...gosto do que é simples , do que se extrai da vida isto sim é poesia, é conto, é história, é texto..."anônimos "

    Beijos e obrigada por sempre participar com suas sábias palavras em meu blog..

    Djair...

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