Naquele dia, à tarde, como sempre fomos dar uma caminhada pelas ruas da Amadora, antes de pararmos num café para descansar e comer um travesseiro ou um nata. Pegamos um caminho que ainda não tínhamos feito e acabamos por ir dar num bairro não muito favorecido, embora os bairros novos ao redor, todos, fossem de uma classe mais privilegiada que aquela que ali habitava, seja pelo estado das casas, seja pelo entorno e serviços (ou a falta deles) de embelezamento da junta de freguesia.
Uma casinha chamou-nos a atenção, não pelo atulhado de coisas que havia no quintal ou pela simplicidade dela, mas pela beleza das plantas, uma em especial, repleta de flores amarelas no que parecia ser uma suculenta enorme. Paramos ali a apreciar, eu, lógico, cobiçando muito uma muda da tal planta. Logo uma senhora, bem adiantada em anos, uma velhinha mesmo, aparece dando bons dias. Comentamos da planta e ela engaja uma longa conversa sobre plantas, que esvai pelo marido que perdeu e pelo filho que veio fazer-lhe companhia. É nítida a falta de interlocutores, e assim lhe damos atenção ao ouvir sua realidade e até como um carinho que seria ouvir-lhe. Chega mesmo a fazer indiscrições não apropriadas sobre o quanto recebe de pensão, o que, para cá, deste lado do Atlântico, seria um grande risco dizer, e mesmo lá, creio...
Conversa adiantada, fazemos menção de seguir o passeio. Foi quando ela diz que tem lá três latas de atum, se não queríamos alguma, a qual nos daria com gosto, e tais... Recusamos, mas aceitamos os ramos de ervas para chá, oferecidos, que ela vai a colher ali mesmo no jardim. Hortelã é que agora lembro-me, mas havia outras.
Seguimos o passeio, proveitoso em todos os sentidos, numa tarde alegre e embevecida pelo sorriso e afeto da boa velhinha que assim eternizou-se em minha memória.