quinta-feira, 15 de março de 2018

Eguagem

Se está tudo na cabeça, porque não consegue migrar para o papel?
Todas as justificações, todo o plano de trabalho, tudo, tudo está ali... Mas tem aversão à tela, aos caracteres, significantes, significados, palavras, frases, metáforas, mesmo oximoros... Permanecem nas sombras do cérebro, não querem abandonar a caixa craniana, e permanecem a espreita. Verbalizar sim, oralmente, como a cultura africana, a nordestina do cordel, a mineira dos casos... Fora o alfabeto! Ai de mim que permaneço insone mesmo quando o corpo só deseja a cama. Depressão pré-texto? Porque não? Não há de ser menor que a pós-parto. Sim, antes das pedras atiradas guardem as proporções, e lembrem-se do eu lírico. Que à merda vão as explicações que me são cobradas.
Sem palavras. Não as quero, só abraços.
Verbalizem sentimentos com atos, não com renhenhéns, prajalpas e três beijinhos, que nem são dados à face, mas ao vento.
Quero minhas palavras de volta, não as metáforas e poesia que vem mais facilmente,
mas a do texto técnico. Sou da produção… O administrativo me entedia e mata. Já não aguento mais tomar café. E o tomo por pura desculpa para protelar. Ah a procrastinação, essa minha amante tão sedutora…
Tão o é a ponto de ter fugido do texto que deveria estar a escrever e vim embrenhar-me neste. Pobre coitado que escreve textos fúteis e listas de compras que sempre esquece de levar. Que escreve cartas sem respostas pois hoje todos preferem e-mails. Que manda cartões postais que as pessoas não recebem pois os correios hoje são uma piada de mau gosto.
Ah quanto lamento… Mas para isso também servem as palavras.
E se só a elas tenho, que vão ela ocupar a tela, fazer-me companhia e distrair-me ainda mais.
As ciladas que me meto… As coisas que aceito sem ter certeza de dar conta. Que a bem da verdade muitas vezes saem bem, mas que só eu sei o sofrimento por trás do cenário erguido.
Ai de mim. Que se digo não sou compreendido, se não digo muito pior, e que se tenho muito a dizer prefiro calar-me. Que vejo demais, que presto atenção demais em coisas que não mereceriam uma olhadela de escárnio.
E que se essas aqui saíram fáceis, voltemos ao trabalho e encerremos aqui essa éguagem. Que se fé eu tivesse rezava agora com fervor sem sentir pena de mim e deus existindo, e sendo mulher, dava-me carinho de mãe e inspiração de técnico. Vamos ao trabalho, que esse desabafo já deu.

4 comentários:

  1. Que delícia olha o Prajalpa de volta com toda sua força. Agora vai, vai tudo o técnico, o lirico o cão raivoso!!! Super beijo

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  2. Pois não é que foi Lê, fiz o texto do projecto e acabei de apresentar. Foi fixe.

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  3. Coragem!!! Poético, técnico...tudo bem da alma, da sua alma...
    Bjss

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  4. Achei ótimo, um sabor de crônica de José de Alencar (furioso).
    Zizi

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