quinta-feira, 7 de novembro de 2013

Respeito, Conceito, Pré-conceito... Preconceito!



“Deve ser erro meu querer jardim lá onde a natureza só pretende selva.”
Marina Colasanti

            Esta semana, nas redes sociais, duas noticias bombaram e suscitaram diversos comentários de protestos. A primeira, uma reportagem da revista Veja (cuja versão on line trazia um vídeo) sobre um suposto “rei do camarote” (e não, não vou falar de nossa nostalgia de uma monarquia que por aqui não durou tanto – e que se nota nos “reis e rainhas” que nomeiam tudo... O do futebol, o da voz, o da soja, a dos baixinhos, os do carnaval, da noite e por ai vai...). Mas enfim, quem quiser ver o tal vídeo é só acessar o youtube.
            A segunda, o cantor (?) Justin Bieber  que, após ser atingido por uma garrafa plástica no palco em um show, o teria abandonado, xingado fãs e cancelado a turnê que fazia por aqui. Não, ele não deve ter sido informado da tempestade de garrafas plásticas que desabou sobre Carlinhos Brown em uma edição do Rock´n Rio há alguns anos...
            Mas o que mais me chocou foram os comentários idiotas a respeito de ambos os casos, a demonstrar ignorância ainda maior que dos dois e preconceito explicito. Afinal, ao mesmo tempo que se chocavam com comportamentos, mostravam reações primarias de homofobia. O primeiro se refere ao tal rei do camarote, o segundo ao cantor:
Idiota I:          “Nossa que cara chato!!! e é gay ainda !”
Idiota II:    Éh uma Biba Mirim!....naum vale a pena comentar, deixa que a Hemorroida dele estoura sózinha!!!”
Textos transcritos Ipsis litteris (logo erros e dialetos preservados).
E se o assunto fosse um atentado dos “machos” sobre homossexuais como os que houve tempos atrás na Paulista, em Pinheiros e que ocorrem diariamente sem que sejam noticiados? Ora, fosse esse o tema das postagens, provavelmente os comentaristas (esses dois pelo menos) se calariam. É possível também que fizessem coro a vozes que protestaram contra aqueles ataques já citados. Afinal, a diversidade só costuma ser respeitada por quem faz parte daquela diversidade que o inclui. Fora isso, é o mesmo desrespeito por desconhecimento, preconceito, ignorância e xenofobismo ou mesmo muitas vezes negação.
O mesmo preconceito que leva a culpar a mulher pelo seu estupro, o gay por preferências as quais talvez ele mesmo tenha negado e lutado contra durante anos, o negro que nasceu negro por ser filho de negros, o miserável que não teve chances ou forças para sair de seu estado marginalizado, o nordestino que migrou para tentar dar melhores condições aos seus, assim como o fizeram japoneses e italianos, coreanos, árabes e tantos outros. O que faz aceitar um e não outros muitas vezes é a beleza externa ou uma ascendência dita nobre, e aí qual a diferença entre os que têm dinheiro e esbanjam em camarotes? O fato do tal rei do camarote ser gay acaso aumentaria o choque pelo modo como vê a vida, a importância às superficialidades que ele cultua? Se ele fosse mais másculo e fizesse a cara de mau, comum aos rapazes que querem ostentar sua masculinidade, teria diminuído sua boçalidade? Mas o comentário idiota (I) faz parecer que o pior seria ele ser gay. O fato de ser gay para essa pessoa é pior que ser boçal, é pior que quaisquer desvios de comportamento ou de caráter.
Renato Russo, Freddie Mercure, Cazuza, Ney Matogrosso, Elton John, todos gays, e seu comportamento no palco irrepreensível, suas músicas, suas vozes, seu espetáculo. Qual a preocupação com o que eles fazem do seu corpo? O fato de serem gays os diminui enquanto pessoas? Enquanto artistas? Porque então a qualificação de “É GAY” como desqualificador de personalidade ou sinônimo de comportamento histérico ou inadequado? Inveja? Bem, se é isso é só dar também! Mas o caso é que o preconceito está ali latente, e depois quando questionado, desconversa-se: “não era bem assim... eu tenho até amigos gays...” Pois é... Não é preconceito, né?

Foto - Djair - Serpentes. René Lalique, 1898-1899. - Fundação Calouste Gulbenkian - Lisboa,  Portugal

sexta-feira, 1 de novembro de 2013

Siroco




Quem sabe o vento esbarre no rufar dos tambores d’África
e traga seus sons para que se possa fazer ouvir meus moucos ouvidos,
assim possa eu, num ritmo que entonteça, soltar um grito
que desengasgue tudo que prendo e engulo
(em seco): 
todo peso, toda culpa que a América cristã me infunde.


Foto: Djair - detalhe de mural em Inhotim - Brumadinho - MG